Olá, leitores! Hoje vim trazer para vocês um conto incrível que o autor Rob Camilotti gentilmente cedeu para o blog. O conto é um dentre outros do livro “Quilômetro Cinza e Outros Contos de Cabeça” que saiu quentinho do forno para nossa apreciação. Nesse mundo vasto da literatura, o conto é um dos meus gêneros favoritos, então nada melhor do que trazer um pouquinho desse universo para o blog. Apreciem sem moderação! Conheci o escritor Rob Camilotti recentemente e espero poder trazer mais de seus escritos para blog e, claro, trazer uma resenha após a leitura do livro completo. As informações de como adquirir o livro estão no final do post. Sem mais delongas, vamos ao conto!

CONTO: Quilômetro Cinza (Um caso vampiro em São Paulo).
Escrito por Rob Camilotti.

Hiroilto foi sem destino então. Fincou a chave no carro, desobedecendo a advertência veiculada continuamente no rádio para que ficasse em casa dada à excepcionalidade do que ocorria com o tempo em São Paulo. - “Talvez, o clima esteja igual no mundo.” - pensou enquanto dirigia.
“Que está acontecendo?” - a neve caía torrencial ao longo da Bandeirantes, em flocos grossos, instalando o frio que não era menos aterrador. Foi percebendo que, enquanto dirigia, era literalmente o único em toda a cidade que havia tido a ideia de se atirar ao desconhecido, mas dirigiu o carro com cuidado em todo momento. Certa hora, Hiroilto parou ao avistar, no acostamento da marginal, um menino sozinho que não aparentava ter mais de dez anos. Deu duas pancadinhas no vidro do carro como quem o anunciava que podia se aproximar, só que o menino porém limitou-se a olhar em sua direção, dando a entender que não entendia o que Hiroilto queria. - “Ele vai morrer congelado se eu não tirá-lo de lá”. - abriu a porta do carro e se entregou ao frio.
A pista estava escorregadia por causa de uma crosta de neve que, com alguma rapidez, acumulava-se nas bordas, quase que se estendendo a um rio congelado. Tinha que ser mais ligeiro no resgate ao menino. - “Não tenha medo, garoto, deixa eu te ajudar!” - estendeu-lhe a mão enquanto caminhava, para que viesse ao seu encontro, porém, de novo, o menino não reagiu. Valente, no que se aproximou, Hiroilto envolveu o menino nos seus braços e o levou com ligeireza para dentro do carro. - “Que merda, Hiroilto!” - na pressa de socorrê-lo, Hiroilto esqueceu de fechar a porta ao sair do carro e uma boa camada de neve encobria todo banco do motorista. Com duas braçadas generosas, expulsou a maior parte da neve. Entrou no carro mesmo assim e colocou o menino sentado no banco do carona, ao seu lado.
“Ufa, que aventura hein?! Como se chama, garoto?”
O menino respondeu:
“CD.”
“CD?” - sorriu para o menino, que fez que sim com a cabeça. - “Prazer em conhecê-lo, CD. Vou levá-lo para casa, certo? Onde estão seus pais?” - Hiroilto não disfarçou a afeição que já sentia pelo menino.
CD não o respondeu. Em vez disso, lançou-lhe um olhar opaco, fosco, inabilitado de sentir. Hiroilto presumiu desse modo que o menino não tivesse os pais e que, justamento por isso, o encontrara na rua.
“Pobre garoto!” - exclamou baixo. Disse em seguida. - “Vamos ficar juntos até que a neve passe e depois te levo para uma delegacia. Quem sabe eles não te arrumam uns pais bem legais! Combinado assim, CD?”
CD o encarou com desinteresse. Deu-se a entender que, para ele, tanto importava o que fariam depois. CD tinha o rosto e as mãozinhas tão brancos que impressionavam fortemente Hiroilto, e cada vez mais.
“Está com frio?”
“Um pouco.” - CD respondeu.
“Coitadinho! Não se preocupe porque já estamos chegando. Vou te levar para casa.”
E Hiroilto passou-lhe as mãos nos cabelos, confortando-o. Ao fazer isso, se impressionou mais uma vez: os cabelos de CD estavam extremamente secos e sua pele, sem viço algum, ficava cada vez mais branca, diferente em comparação a qualquer outra que já havia visto, como a de um cadáver de um menino congelado. Em seguida, ao levar a mão ao nariz e cheirá-la, quase vomitou ao sentir um cheiro terrivelmente podre em um pouquinho de óleo que se impregnara na ponta dos dedos. Era como se houvesse acabado de passar a mão na carniça de um animal morto. Assustado, decidiu levar o menino direto para uma delegacia, invés de levá-lo para casa como o havia prometido.
“Estou com fome e eu quero comer agora.” - CD pôs as mãozinhas sobre sua barriga.
“Já estamos chegando em casa, CD.” - Hiroilto escondeu-lhe aonde verdadeiramente estavam indo. - “Aguente só mais um pouco, combinado?” - e foi acelerando o carro, mostrando pressa em se livrar do menino.
“Eu disse que eu quero comer agora, não me ouviu?”
O menino, antes indefeso, se revelou então. Ao olhar para o lado, Hiroilto foi tomado pelo horror. Criatura medonha, a cabeça de CD revelou-se peluda; as orelhas, os olhos, o nariz e os dentes fininhos lembravam os de um asqueroso morcego.
“Não precisa ser do jeito mais doloroso para você. Só quero um pouco de sangue. Vou transformá-lo.”
“Vá embora, demônio!” - Hiroilto enfiou o pé no freio.
Com toda calma possível, CD, pequeno conde vampiro, foi se aproximando lentamente do homem, que, já em paz e a vontade com seu destino, sentiu cravar os dentinhos na jugular.
“Só uma dose do seu sangue.”

FIM

O conto “Quilômetro Cinza” se soma a outras quinze histórias que fazem parte do livro “Quilômetro Cinza e Outros Contos de Cabeça”.
O livro está à venda na Amazon em formato eBook através do endereço
https://www.amazon.com.br/dp/B073TRN521/
ou em versão impressa pelo link
https://www.amazon.com/dp/1521801509/

Sinopse: "Obra-prima de Graciliano Ramos, "Vidas secas" exibe o limite da incomunicabilidade e animalização do homem na família de retirantes que se desloca em movimento circular entre uma trégua e outra dada pela hostilidade da natureza."Vidas Secas" é o livro mais popular de Graciliano Ramos. A história de uma família de retirantes, impelida pela seca, já foi chamada romance desmontável. Ou comparado aos quadros de uma exposição. Mas quadros talhados em madeira, fortes, duros, que de uma despojada beleza nos mostram Fabiano, sinhá Vitória, os dois meninos ou a cachorra Baleia. O estilo é certamente o mais puro e característico de Graciliano Ramos, escritor que se tornou o clássico moderno da literatura brasileira."

Ano: 1980 (edição) - 1930 (publicação original)
Gênero: romance
Páginas: 160
Editora: Record (edição lida)

A história de "Vidas Secas" se passa no complicado e traiçoeiro nordeste que ora dá a graça de pouca chuva e ora é tão escaldante que chega a ser capaz de levar vidas embora sem piedade. Nessa história, entramos na vida de simples nordestinos que passam suas pequenas vidas em busca de sonhos e dignidade.Fabiano, o chefe da família, mal sabe falar e seus filhos se assemelham com "bichinhos do mato" que, assim como o pai, conhecem e dominam bem pouco a fala. Sinha Vitória, a mulher da casa, é sonhadora e espera um dia poder dar aos filhos uma vida boa e cheia de conhecimento.






No desenrolar da história, conhecemos Baleia, uma cachorrinha fiel e companheira que é capaz de tudo para ajudar seus donos e os acompanha aonde forem.


É uma obra literária um pouco complexa, pois foi escrita a um certo tempo, e traz uma história triste sobre encontrar seu lugar no mundo e ir em busca dos ideais.






Nunca havia me emocionado tanto com um livro. Graciliano Ramos nos transporta para dentro do livro, nos apresentando uma nova visão sobre o mundo e até mesmo sobre a vida.


Confesso que chorei ao terminar a leitura. Não tinha costume de ler literatura nacional e depois de ler "Vidas Secas" passei a ler com maior frequência. 






Meu personagem favorito do livro é a cachorra Baleia. O autor conseguiu transformar um simples animal em um ser totalmente ciente do mundo ao redor. Baleia é simplesmente fantástica. Fiquei muito chateada com o que acontece com ela. Me prendi tanto ao livro que chorei pela Baleia. Graciliano é realmente incrível em sua descrição e narrativa. 






Ah, eu não poderia esquecer de comentar sobre o coitado do papagaio! Coitadinho! Acho que sou meio melosa, mas me comovi com muitas partes do livro. Cada novo capítulo era uma nova emoção, cada novo capítulo me dava mais vontade de abraçar e acolher essa família. Como não amar esse livro? Como não amar esse autor que me proporcionou horas de agradáveis e inesperadas emoções? 


Além do livro ser espetacular em seu enredo, o autor abusa de expressões "sertanejas", o que dá um toque perfeito ao livro. A abordagem sobre o abuso de autoridade também é mais um toque excelente. Literatura de ótima qualidade.
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